
“Eu canto tudo de Canudos”
A trajetória artística de Bião
O Sertão tem seus sons típicos como o cantar de um bem-te-vi ou de uma asa branca, o soprar do vento em um pé de algaroba ou o ritmo único que surge do encontro entre a sanfona, o triângulo e a zabumba. Pelos ouvidos, a vida ganha alegria e, para ouvir, é preciso ser sensível. A Bião de Canudos, essa sensibilidade nunca faltou. Antes de qualquer palco, disco gravado ou do primeiro violão, ele aprendeu olhando e ouvindo.
“ Acho que já nasci com o dom e fui aperfeiçoando. Eu era muito curioso, gostava de ouvir quando tinha alguém tocando, eu sempre acompanhava e daí que eu consegui ingressar na música”, afirma Bião ao falar do surgimento da música na vida dele.
As primeiras “apresentações” que Bião realizou foram ainda na infância, junto dos amigos. Ele e a turma da vizinhança costumavam brincar de conjunto musical e improvisavam instrumentos de materiais recicláveis para imaginarem, da imensidão do próprio quintal, serem os maiores astros da música. Essas brincadeiras fizeram crescer no peito do menino o sonho de ser cantor.

Bião adolescente (lado esquerdo) ao lado de amigos brincando de conjunto musical - Fonte: acervo pessoal de Bião
Mas a primeira vez que Bião subiu em um palco de frente para uma plateia foi em um circo, ainda pré-adolescente. Foi em um show de calouros, daqueles em que o apresentador pergunta na hora quem quer se arriscar no palco. Bião subiu sem muito cálculo, aquele cenário não era tão diferente do que já havia realizado várias vezes durante a infância. Ele já não se recorda qual foi a música, a lembrança de ter agradado a plateia segue tão doce quanto o prêmio conquistado naquele dia.
A partir daí veio a constatação lenta de que a vida deveria ser “para o lado da música” mesmo. Para seguir essa orientação e fazer valer o dom recebido, o jovem aspirante a cantor precisava de um instrumento. Por volta dos 12 ou 14 anos (a memória guarda os acontecimentos com muito afeto, mas poucas datas), depois de muito insistir para Dona Maria, sua mãe, ela cedeu e comprou um violão para Bião. O instrumento foi adquirido com Seu Edmundo, que tocava bandolim e tinha uma loja de música na comunidade.
Em posse do objeto e sem conseguir esconder o sorriso que reluzia todo o brilho do sol do sertão, ele começou a deslanchar as primeiras notas, observando o irmão, Araújo, e outros tocadores do local. Não houve professor, método e nem caderno pautado, Bião aprendeu apenas com a sensibilidade dos olhos e ouvidos. Ele chegava em casa e repetia os acordes até acertar. Até tentou se aproximar da bateria por um tempo, mas a paixão da vida dele ficou presa entre as seis cordas.
Aos 14 anos, começaram a brotar as primeiras composições. O primeiro dinheiro conquistado com a música também veio nessa época. O circuito de shows era nas feiras, bares, aniversários, qualquer palco em que coubesse um violão e uma voz. “Onde achava, eu fazia show e, logo, me tornei um músico. Com 17 para 18 anos, comecei a compor para valer e ingressei na música”, relembra com orgulho no olhar.
A escolha de um campo
O primeiro repertório apontava para o que Bião chama de “as raízes”: Luiz Gonzaga, que transformou o Nordeste em um reino. Mas, com a audição sempre sensível, ele também trazia outros nomes para as apresentações, como Belchior e Zé Geraldo. As escolhas não eram pela estética e embelezamento dos shows, e sim pela maneira de cantar, pela poesia do cotidiano. Bião decidiu que seu centro era a canção regional, a que fala do Sertão, das águas do Rio Vaza-Barris, que banha Canudos, do cotidiano da cidade e do seu povo.
É daí que vem a coerência musical que ele preserva até hoje: não canta de tudo nos shows, o repertório é guiado pelo pertencimento e regionalismo. Quando surge algum pedido fora do gênero, ele até arrisca um pedaço, por cortesia, mas volta para o lugar onde suas próprias canções têm morada. Bião não escolhe somente o que canta, escolhe do que fala e sabe da responsabilidade que carrega.
José Alex Oliveira, o produtor cultural e músico que todos conhecem como “Lequinho”, explica que para ele, Bião não pode ser enquadrado em nenhum gênero musical. Para Lequinho, esse artista está em outro campo da música.
A virada para os palcos
Quem acompanhou de perto a transição de Bião de Canudos para os palcos foi justamente o próprio Lequinho. Para falar de Bião, Lequinho muda o timbre e conta a história de um amigo e parceiro musical, devotando respeito e carinho a quem, para ele, é um ídolo na música

Lequinho em uma das suas apresentações ao lado de Bião de Canudos - Fonte: acervo pessoal de Lequinho
No início dos anos 1990, Bião começava a fazer apresentações maiores e Lequinho costumava ir aos shows, principalmente na Concha Acústica, localizada na praça principal, no Centro de Canudos. Lequinho gostava de ficar na grade, o mais próximo possível do seu ídolo, “como qualquer criança, ansioso para ver o artista”. Aquela cena possuía um outro lado também, enquanto um estava admirado com a apresentação, outros soltavam farpas:
“já vem Bião com as músicas de Canudos”. Para Lequinho, Bião foi uma vítima silenciosa do peso que a história de Canudos carregava na época.
Bião dedicava parte do seu tempo à escrita de novas composições para o próprio repertório e, ainda na década de 1990, transitava entre barzinhos e palcos em busca de se firmar. Em 1996, a banda canudense A Favorita do Brasil iria gravar o primeiro CD e Bião resolveu doar três músicas para compor o álbum. O gesto foi devolvido com um convite para cantar as músicas durante a gravação. Com o bom desempenho, foi convidado a cantar na banda durante um período e acabou ficando cerca de 10 anos.
Ali, ele aprendeu a respirar em grupo, repartir arranjos, a sustentar o palco com a energia compartilhada entre os músicos. Em paralelo, manteve o circuito de festas, clubes e praças sem fazer distinção entre grande e pequeno. “Onde pedirem, eu canto”. Para Bião, esse processo é natural, é parte do cotidiano
Para Bião, o compositor e o intérprete são “a mesma pessoa”, mas o palco exige uma energia diferente. O Bião artista “leva alegria, leva o nome das pessoas, do lugar”. Mas o Bião pessoal, o sujeito, é “mais calmo, mais tímido, gosta de ficar sozinho”. Para ele, isso não é uma contradição, mas uma adaptação. Nos palcos, ele se abre para a presença do público. No cotidiano, se recolhe e gosta do silêncio de que a criação precisa.
A relação com o público mudou com o tempo, mas no sentido de amadurecimento. Não importa o tamanho do palco em que cante, no outro dia, Bião é o mesmo — vai ao mercado, à feira, e guarda com muita gratidão cada demonstração de afeto que recebe do público.
O estúdio como extensão do palco
Da amizade entre Lequinho e Bião, nasceu um dos momentos mais decisivos da carreira: o primeiro álbum autoral do artista. Antes dele, a voz de Bião era ouvida nos shows ou, raras vezes, em registros de terceiros. Lequinho, enquanto produtor, queria um “um cd dele, autoral”. No começo dos anos 2000, montar um estúdio em Canudos não era uma decisão e, muito menos, tarefa fácil. Não havia internet, os equipamentos eram caros e o conhecimento técnico circulava devagar. Mesmo assim, o primeiro estúdio que Lequinho montou foi no próprio quarto.
Um microfone simples, uma voz-guia de Bião, o violão marcando a harmonia das músicas, e, sobre esse esqueleto, o produtor programava no teclado os arranjos musicais camada por camada. Para Lequinho, o arranjo da música não vem para maquiar, vem para destacar.
Em 2002, chega “Canta Canudos”, um marco que mudou a percepção do público sobre Bião. A partir daquele momento, as músicas circulavam na rádio, havia uma capa, uma ordem para as músicas. “Quando ele gravou o primeiro álbum, todo mundo teve outra visão”, afirma Lequinho. Há ali também a chancela de outra artista popular na cidade, Vida Mendes. Ela era vocalista da Favorita do Brasil e aceitou o convite para interpretar “Esperança” e “Atrás da palmeira” ao lado de Bião.



Quatro anos depois, “Matuto do Cocorobó” (2006) é lançado com um novo processo de produção. O estúdio saiu do quarto de Lequinho e foi para um espaço separado na casa, a estrutura técnica ficou mais sólida, a qualidade de captação melhorou, mas a essência do trabalho foi mantida. Nada de playbacks genéricos ou samples que apagam as marcas da história que a voz de Bião carrega. O trabalho permanece erguido com originalidade. Esse álbum também traz outra temperatura. O primeiro cantava o grito de protesto, os horrores do massacre, enquanto o segundo é um disco de vitórias, de horizonte mais claro. “Algumas coisas provocadas no primeiro CD foram resolvidas, o segundo é um disco de mais esperança, é possível sentir mais alegria”, diz Lequinho.
Canudos como matéria-prima das obras
A pergunta “por que cantar Canudos?” acompanha o artista e a resposta é a chave de leitura para a sua obra. Bião não canta só Canudos, ele canta o mundo a partir da sua cidade. Os inúmeros personagens locais que aparecem nas músicas dele são um arquivo vivo do lugar. Manqueira, figura popular de Canudos que tocava com folhas de figo; Pilusca, doceira local que vendia cocadas; Dona Mariá, parteira que fez o parto dos filhos de Bião e outros tantos, como Zeca do Pão, Eginaldo, Santana, Ciço Cardeal. Estas são algumas das figuras que Bião apresenta, registra e também dignifica em suas letras, como se estivesse compondo um retrato amoroso ou um álbum de lembranças. Os nomes entram nas músicas e, ao mesmo tempo, num ciclo de memórias, proporcionando reconhecimento entre os mais antigos, curiosidade para os mais jovens e interesse para aqueles que compõem as histórias do presente. “As crianças perguntam quem foi Manqueira. As pessoas querem ser citadas nas músicas, tem gente que me pergunta quando vai sair uma música com o nome delas”, conta Bião.
As fontes de referências para os processos de composição de Bião são, em grande parte, orais. Histórias que ele ouviu, viu e viveu. Quando vem de livro, é porque o livro também entrou na vida, afirma. Porém, na maioria das vezes, o que move a criatividade de Bião é a experiência: a mãe que dizia ditados populares, a madrugada em que ele foi buscar a parteira para o primeiro filho, os dias de trabalho na roça, as vezes em que morou em outras cidades. Quase nada nas suas músicas é “miragem”, como ele diz ao falar sobre frutos da imaginação.
Para compor sobre essas memórias e personagens, Bião não tem fórmulas. As inspirações para cada música vieram em momentos diferentes. Algumas são mais rápidas e saem em uma mesa de bar, como aconteceu com a composição de “Terra querida”. A canção foi escrita durante a Semana Cultural de Canudos, no mandato de João Ribeiro Gama (conhecido na cidade como Zito). Sentado em uma mesa com os amigos, o grupo começou a elogiar a cidade e o evento. Ali mesmo, ele começou a escrever parte da letra e, ao chegar em casa, terminou a composição.
À beira do asfalto, uma das principais composições, foi escrita em partes. Bião começou a música em solo canudense. Com os rascunhos, tentava colocar no papel aquilo que estava na mente, mas a canção só foi finalizada nos anos de exército. Bião faz suas músicas para registrar a memória do povo e devolvê-las em forma de canção.
A canção 'Belo Monte' e o fio da história
A pergunta sobre qual música Bião considera que resume a própria carreira artística não é fácil, por isso ele tropeça: “agora você me pegou”. Mas logo em seguida, ele escolhe Belo Monte. A canção, ele diz, deixa uma mensagem de esperança e liberdade, apesar da melancolia que há no timbre e na melodia. A música que fala de dor e resistência é a raiz da genealogia dele. Hermenegilda, bisavó de Bião, foi uma das sobreviventes do massacre de Canudos e, ao fim da barbárie do Estado, ela foi uma das crianças levadas do local pelos soldados para cidades como Salvador e Rio de Janeiro. Bião juntou guerra, reconstrução, barragem e o desejo de liberdade e traduziu em versos a história de um povo. Implicitamente, ele uniu ainda a migração para os grandes centros e a vontade de voltar para casa.
Bião considera Belo Monte a canção que resume a musicografia dele. A música é usada em colégios da cidade, celebrações da história e outros eventos culturais do lugar. “Padre João uma vez me disse que eu ainda não consegui fazer outra igual, mas se ainda não fiz, vou fazer”.
Troféus físicos e aquilo que
não cabe na estante
Os troféus e comendas aparecem como marcas materiais de reconhecimento. Bião enumera aquelas que a memória consegue alcançar: Comenda do Conselheiro na Câmara de Canudos; Comenda do Conselheiro em Quixeramobim; homenagens no Encontro dos Canudenses. Esses são alguns dos vários prêmios que já recebeu durante a carreira, mas um deles tem um local especial no coração do cantor.




Em 2011, enquanto cursava o ensino médio pelo programa de Educação para Jovens e Adultos (EJA), Bião se inscreveu para a 4ª edição da etapa local do Festival Anual da Canção Estudantil (FACE). Músico consolidado, venceu em Canudos e avançou para competir na etapa regional na cidade de Serrinha. Na capital da vaquejada, Bião encontrou novamente o caminho da vitória e conseguiu uma vaga na final que foi disputada em Salvador contra os melhores do estado.
Ele ficou uma semana na capital baiana se revezando entre reconhecimento de palco, aulas de canto e ensaios. Após as apresentações dos finalistas, chegada a hora de anunciar os vencedores, a estrela de Bião insistia em brilhar e, novamente, ele conseguiu ficar com a primeira colocação para garantir a alegria dos milhares de canudenses que ele representava

Bião no Festival Anual da Canção Estudantil - Fonte: Acervo pessoal de Bião
Apesar do carinho por esse prêmio, segundo ele, não há distinção, de modo que todos são representativos. Para o artista, mais importante do que a lista de prêmios e os troféus que recebeu, é a grandeza do seu trabalho virar referência quando os visitantes perguntam “quem canta na cidade?”.
O reconhecimento e carinho do público com o seu ofício, ser convidado para cantar em escolas, eventos oficiais da cidade ou mesmo ser parado na rua para receber um elogio pelo trabalho desenvolvido, esses são os maiores ganhos de sua carreira, declara. Esse reconhecimento não acontece apenas em Canudos. Em outros territórios, a obra de Bião também é apreciada. Nesses outros locais, o público acessa a sua obra com um acolhimento que o surpreende. Não importa se em Salvador, São Paulo ou em Quixeramobim, no Ceará, onde Bião chega, o público o abraça e ele se alegra por ser visto com respeito também fora de casa. “Às vezes, o público de fora recebe a gente melhor que o de casa”, comenta sem ressentimento, destacando o fenômeno.
Hino de Canudos: um presente à cidade
Talvez nenhum trabalho explique tanto a ligação entre artista e cidade quanto o Hino de Canudos. “Eu achei que Canudos merecia mais um presente. Pesquisei na Câmara e não tinha hino oficializado”. A decisão nasceu do coração, da vontade de mais uma vez transformar história, memória e identidade em música. O processo exigiu um tempo de cuidado maior, foi necessário cerca de um ano de escrita e reescrita. Grande parte do processo foi feito no rancho Aroeira, lugar em que Bião encontra paz, descanso e tempo, elementos fundamentais para a criação artística.
Ali, ele mexeu nas notas, encontrou estrofes, pediu a opinião de Zezeca (a esposa) e de Leonardo (o filho mais velho). “Zezeca foi me auxiliando. Ela não é compositora, mas tem muita noção de onde encaixar uma frase, de como ajustar”. Outro personagem importante para a existência do hino é Lequinho, e o episódio dá a dimensão do que é o trabalho conjunto dos dois.
Após a finalização da letra, Bião levou a canção até Lequinho, que, sem orquestra, desenhou no teclado uma banda de fanfarra e gravou. A gravação era para ser um esboço. Dada a necessidade de apresentar uma versão à Câmara de Vereadores para o início do processo legal de oficialização, eles apresentaram esse esboço, que logo ganhou a rua.
Alguns tempo depois, ainda em processo de oficialização do hino, Lequinho estava na gestão municipal como secretário executivo de cultura. Foi ele quem conduziu a comissão que fez o decreto para tornar oficial a composição de Bião como Hino de Canudos. Durante a escrita do decreto, Bião não estava presente, mas Lequinho fazia a parte que lhe cabia como secretário. Ao final do rito, as lágrimas correram pelo rosto de Lequinho como a água que corre pelo vaza-barris. Naquele momento, Lequinho percebeu haver também entrado para a história de Canudos.



Com o hino oficializado, Bião também entendeu que sua voz ecoará pela eternidade canudense. A composição, para Bião, parece ser o ápice. Nos Shows, é a única música em que ele agradece a Deus pelo dom que recebeu no nascimento. “Agradeço a Deus todos os dias pelo dom, pela sabedoria, esse aí foi sabedoria mesmo que Deus me mostrou para compor”, diz, olhando para o céu, como se agradecesse mais uma vez.
A letra é composta a partir de elementos que tratam sobre a história e a cultura de Canudos. “O hino conta muito sobre o passado, mas fala também da nossa contemporaneidade. Ele representa o passado e o presente. Ao nível de Brasil, ele é um grito, ele agradece, mas questiona”, analisa Lequinho ao falar de uma obra que ele também assina.
A composição do hino de Canudos também trouxe a Bião um reconhecimento na política institucional da cidade. Antes, ele era um cantor popular que realizava apresentações, na maioria das vezes, em programações culturais. Depois, passou a ser convidado para cantar em outros espaços como aberturas de eventos, celebrações da independência da República, sessões na Câmara de Vereadores e apresentações em eventos escolares. A letra também está impressa nos livros didáticos do município. “Em todo evento [do município] canta o hino, a gente teve um reconhecimento maior devido a esse trabalho”, comenta Bião.
Lequinho rememora à população canudense um fato sutil, mas muito importante, que passa despercebido. "Nos temos o cantor e compositor do nosso hino ainda vivo. Poucas cidade e países no mundo tem esse privilégio"
Sonhos por cumprir, legado para deixar
“Bião de Canudos” não é somente uma assinatura artística, é uma declaração. Ele repete que o nome “tem me dado muitos amigos” e que, no município, é tudo. O “de Canudos” associa o sujeito ao território e faz com que, onde a música dele chegue, a cidade também seja ouvida. O que ele faz é levar as histórias do lugar para além dos limites imaginários do município. Por isso, ele nomeia os personagens, canta o vaza-barris e as canções viram fonte de impulso para levar Canudos ao mundo.
Carregar o nome de Canudos é a missão que Bião leva até nos próprios sonhos. O maior deles é simples e gigante: “Ser reconhecido no Brasil, no mundo; ver minha obra gravada por muitos artistas; fazer um show para cem mil pessoas”. Todos os desejos, ligados à música, revelam também uma vontade de elevar o nome da cidade, que o acompanha simbolicamente como elemento de identificação de quem e de onde ele é. O artista não sabe quando esse sonho será efetivado, afirmando que “para Deus não tem idade”. A esperança que carrega é a maneira de permanecer à altura do dom que recebeu.
Esse e outros sonhos de Bião ainda estão para serem realizados, mas o legado que vai ficar para a posteridade já foi escrito, já está gravado na cidade, no povo.
Aos 61 anos de vida e mais de 40 de carreira, Bião se define como “mais maduro, mais experiente”, atento à qualidade musical, cuidadoso com o repertório e com a linha musical das apresentações. O tempo tem feito bem ao artista. “Um senhor me disse na igreja que eu tô envelhecendo igual vinho”, ele ri ao lembrar o elogio. Mesmo após tantos anos, prêmios, homenagens e reconhecimento, Bião ainda quer fazer canções melhores, quer agradar ainda mais.
E quando a vida aperta a ponto de sufocar, a fresta que o artista abre na casca da realidade para conseguir respirar também é com música.
“A música tem até curado algumas feridas, sabe?!” Às vezes estou num momento difícil, aí eu pego o violão, relaxo, faço uma cantoria, ali parece que tudo é um bálsamo. Então, a música para mim é importante demais”